A essência do Aikido


Desequilibrar o adversário é a essência dos movimentos do Aikido?

Eu diria que a essência do Aikido é o amor. Porém, não qualquer amor, mas aquele que é sinônimo de proteção e de equilíbrio entre opostos. Manter o ser humano equilibrado é a essência.


Poderia explicar melhor?


O grande objetivo de todas as técnicas é a neutralização do movimento de agressão. Quando olhamos a forma antiga de bujutsu, a grande finalidade era exterminar o inimigo o mais rápido possível, ou pelo menos, impossibilitá-lo no campo de batalha. O Fundador do Aikido promoveu uma releitura da antiga forma de bujutsu e nos trouxe o sopro de vida necessário a essa transformação: aquilo que antes serviria para matar, agora geraria vida desenvolvendo plenamente por meio do treino, o corpo e o espírito humano para as batalhas mais sutis.


Mas percebemos em algumas artes marciais que elas se baseiam em chutes e socos para neutralizar a ação do inimigo. O Aikido usa o desequilíbrio para aplicar seus golpes, não é isso mesmo?


O ser humano foi provido pela natureza com pouquíssimos instintos. O mais primitivo é a sucção que os bebês fazem ao serem colocados no peito da mãe, um outro primitivo instinto é de proteger-se ao cair. Por isso, bebês ao caírem tendem a estender os membro e levar o queixo ao peito. Esse último instinto leva o adulto, na iminência de uma queda, fazer o cérebro acionar o piloto automático e comandar o corpo de forma reflexa, ou seja, sem a participação da vontade.  Parece que os grandes mestres do passado já tinham notado isso, então desenvolveram técnicas para retirar a estrutura de base do oponente, provocando o acionamento do piloto automático. Assim, nesse meio tempo, as imobilizações ou lançamentos eram executados. Uma estratégia extremamente racional.


O Fundador do Aikido ampliou essa estratégia?


Eu diria que o Fundador nos conduziu a uma reflexão corporal a partir dessa estratégia do bujutsu. No Aikido estamos constantemente refletindo sobre nossos comportamentos a partir do corpo. A grande finalidade não é somente treinar o corpo, pois o Aikido não é educação física, ele é uma reeducação da mente que se utiliza do corpo. Constantemente estamos refletindo sobre nosso ponto de equilíbrio, onde está o eixo das nossas ações, onde está o foco do que queremos. Diuturnamente estamos refletindo sobre nossos apegos, e passamos a observar o mundo e os outros a partir de vários ângulos, as vezes de cima para baixo, outras vezes de baixo para cima. Encontramos a estabilidade em movimento e o movimento na posição aparentemente mais estática. Treinar é refletir e aprimorar; é reequilibrar dinamicamente a vida. Quando o treino não gera reflexão e aprimoramento, então ele só pode gerar desequilíbrio ao próprio praticante.

Como assim?

O Aikido foi feito para aproximar pessoas e não para subjugá-las. Uma forma de desequilíbrio do próprio praticante é acreditar que, por ter um tempo cronológico suficiente, os mais jovens têm a obrigação de dobrar seu hakama e ainda servir-lhe água. Alguns no ápice do desequilíbrio exigem isso alegando ser um costume do Budo. Na verdade, nem eles fazem isso aos seus próprios senseis, mas exigem isso dos outros. Isso é um tremendo desequilíbrio. São as tendências do desequilíbrio social. Pessoas que se enxergam mais importantes que as outras. Desejam ser líderes para serem servidos, mas esquecem que a palavra “samurai” quer dizer “aquele que serve”. Acredito que esse desequilíbrio não seja o Aikido que promove. Na verdade, algumas pessoas já chegam desequilibradas e querem permanecer assim, então tratam de impor a sua tendência nos locais onde estão inseridas. São pessoas que nitidamente não treinam, não refletem e não se aprimoram. Pessoas muito longes do coração da prática e da sua grande finalidade. Como disse no início, a verdadeira essência é gerar equilíbrio e amor protetivo, isto é, fazer o próprio praticante assumir a responsabilidade de proteger o mundo contra suas próprias tendências agressivas.

Thiago Santana
Thiago Santana

Escola de Aikido

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